segunda-feira, 13 de setembro de 2010

"Sonhando com um País Melhor"

(North Pasárgada Sunset - Grafite)


Sonho com um País melhor. Trata-se de um sonho metafórico. Quero deixar claro que não possuo qualquer aspiração política. Não integro nenhum partido político. Na verdade considero-me um alienado. Considero-me um exilado político-cultural. Vivo em uma pequena cidade ao norte de Pasárgada, longe do domínio monárquico cosmopolita da vizinha sulista, e que ainda mantém um ar provinciano. Manuel possui um terreno ao lado de minha casa. Ele pretende construir uma casa de veraneio. Velho Manuel! Saudosista como sempre! Há alguns dias atrás afirmou-me com um suspiro: “Pasárgada já não é mais a mesma... Bons idos tempos, que desconhecem caminhos de regresso!”

Onde vivo, pela televisão aberta, é possível acompanhar as eleições. Tenho acompanhado os debates presidenciais

Manuel vê os debates comigo, mas não quer saber de eleições. Está satisfeito com a monarquia e é amigo íntimo do Rei. Inclusive, foi justamente devido a política que ele resolveu mudar-se definitivamente para Pasárgada. Velho Manuel! Realista como sempre! Há alguns dias atrás, após o horário eleitoral, afirmou-me com outro suspiro: “O Brasil segue na mesma... Ordem só na Bandeira, o País desconhece os caminhos do progresso!”

Apesar de não possuir um partido, tenho senso crítico. Dentre todos os candidatos, Plínio Soares de Arruda Sampaio me chamou a atenção. Posso estar equivocado em meu julgamento, mas acredito que ele, assim como eu, também sonha com um País melhor. Ao menos ele é possuidor de um espírito de luta louvável. Ele tem 80 anos e um propósito inabalável.

Acredito que morrerei jovem, mas se eu chegar aos 80 anos provavelmente irei me aposentar (independentemente da grandeza de minhas convicções).

Resolvi escrever uma carta ao candidato Plínio, manifestando minha opinião e meu apoio ao seu sonho:


“São José dos Campos - São Paulo. Dia 13 de Setembro de 2010.


Prezado Mestre Plínio Soares de Arruda Sampaio,


Sei que nas vésperas das eleições o senhor possui inúmeros compromissos. Em minha carta não peço que o senhor me responda. Peço-lhe que leia o pouco que tenho a dizer.

Meu nome é Cxxxx Fxxxxxxxx Txxxxxxx. Tenho 28 anos e moro em São José dos Campos, no interior de São Paulo. Economicamente integro a chamada “classe média” deste País.

Escrevo-lhe para manifestar o meu apoio a sua candidatura. Acredito no senhor. Suas palavras e sua postura conquistaram meu voto e minha confiança.

Confesso-lhe que a atual situação política do Brasil me desagrada profundamente. Estou desacreditado. Sinto-me politicamente inválido. Talvez todos os seus eleitores (quiçá até mesmo o senhor) compartilhem, mesmo que em parte, de meus sentimentos de impotência política.

Como mudar um País com um índice de educação tão baixo; com uma classe média tão gananciosa; e com uma burguesia tão poderosa?

Grande parte dos eleitores brasileiros vê o seu discurso como utópico e desmerece todos os signos que remontam às ideologias esquerdistas. Socialismo, Comunismo, Reforma Agrária, Cuba, União Soviética, etc. - são classificados como termos pejorativos.

A sociedade moderna transformou toda a filosofia esquerdista em um clichê vazio e irreal. Os grandes pensadores esquerdistas não passam de curiosidade acadêmica. O martelo e a foice não passam de um desenho sombrio nos livros de história.

A esquerda hoje em dia é moda. É “cult”. A esquerda não evoluiu e virou passado. Um passado que agrega, em sua maioria, saudosistas.

Uma parte da militância esquerdista consciente é formada por jovens universitários que trazem consigo um discurso boêmio e inflamado, uma barba por fazer, chinelos de couro e uma camiseta do Che Guevara. Outra grande parte é formada por militantes que obtiveram inúmeras derrotas e desilusões no decorrer de uma vida de lutas, e parecem duvidar das próprias crenças.
Ambos são vistos com descrédito.

A nossa sociedade não crê na mudança. Ouso dizer que, inclusive, teme a mudança. O brasileiro vive a cultura do medo: onde tudo pode ser pior do que está, caso mude. O brasileiro tem medo de piorar caso tente ser melhor e por isso não se arrisca. Trata-se de um povo alienado e sem consciência da riqueza existente no próprio País.

Sua campanha conta com uma minoria que realmente não teme a mudança. Uma minoria que acredita ser possível um país melhor. Entretanto somos uma minoria insuficiente. Somos alguns poucos caolhos em meio a uma democracia de cegos. Vivemos um exílio cultural.

Admiro suas conquistas e me entristece o fato de que a democracia atual estabeleça regras que impossibilitem a vitória de pessoas como o senhor. O sistema democrático nacional é falho.

Professor Plínio, a política neste país precisa ser repensada. A esquerda precisa ser repensada.

Até o momento o twitter tem se mostrado um grande aliado, mas não possui conteúdo (não passa de um fast-food informativo). O senhor possui projeção agora, mas se nada for feito esse interesse se dissipará; após as eleições outra novidade será a sensação do twitter.
A geração twitter é uma geração de consumistas de informação. Eles querem novas informações. Informações frescas. Novidades a todo o momento, cada vez mais rápido. Essa geração não sabe por que consome tanta informação e conseqüentemente não sabe o que fazer com ela. Trata-se de uma geração sem senso crítico e esse país precisa de formadores de opinião.

O Senhor precisa disponibilizar em seu site, e por ao alcance dos internautas, pormenores de suas propostas. Por exemplo: O seu plano de diretrizes fala em reforma agrária. Mas como será feita a reforma? A terra poderá ser vendida? Haverá acompanhamento do governo sobre a forma como a terra é cultivada? Quais serão os incentivos dados aos trabalhadores agrícolas?
(obs.: As pessoas temem a reforma agrária neste país porque todos os meios de comunicação tratam o tema de forma simplista; com especulações e “achismos”.)

É justamente explicitando os detalhes de suas propostas que o senhor e seu partido criarão um eleitorado formador de opinião.

Sei que o senhor possui assessores extremamente capacitados que cuidam de sua campanha, pois acompanho sua brilhante trajetória, e com esta carta não tenho o intuito de desmerecer o grande trabalho realizado até agora. Trata-se apenas de minha humilde opinião, que tem por finalidade contribuir com a campanha.

Talvez minha opinião seja irrelevante, mas quero que saiba que é honesta e de boa vontade.

O único que peço é, se possível, que me sejam enviados os detalhes (ou pelo menos uma indicação de onde estes detalhes estão) de como o partido cumprirá suas diretrizes (tais informações poderão ser enviadas no e-mail: xxxxxxxxxxxxx@xxxx.com.br).

Mais uma vez, parabéns por sua luta! Desejo-lhe boa sorte nestas eleições!

Conte com meu sincero apoio.

Atenciosamente,

Cxxxx Fxxxxxxxx Txxxxxxx"

terça-feira, 7 de setembro de 2010

"Reflexões em Terceira Pessoa"

(Auto-Retrato Ctrl+C Ctrl+V - Fotografia e Grafite)

“- Que coisa profundamente triste – murmurava Dorian – os olhos fixos no retrato. – Sim, profundamente triste!... Eu ficarei velho, aniquilado e hediondo!... Esta pintura continuará sempre jovem e bela. Nunca será vista mais velha do que hoje, neste dia de junho... Ah! Se fosse possível mudar os destinos; se eu pudesse conservar-me novo e essa pintura pudesse envelhecer! Por isto eu daria tudo!... Não há no mundo o que eu não estivesse disposto a dar em troca... Até a minha alma!...” (O Retrato de Dorian Gray)

Nunca me vi em nenhum de meus sonhos.
Me intriga o fato de meus sonhos serem sempre em primeira pessoa. Acredito que poucas coisas são mais interessantes do que observar a propria imagem; o proprio reflexo. Ver-se com os proprios olhos. Encarar-se e encarar o tempo. Encarar a mudança e a efemeridade inerente à condição humana.

Ultimamente tenho feito alguns auto-retratos, mas não gosto muito de me ver em fotografias. Compartilho um pouco da teoria dos antigos índios. Acho que, de certa forma, a fotografia aprisiona um pedaço da alma do fotografado. Aprisiona o fotografado em um instante específico do passado. Observar uma fotografia é obervar um passado imutável. Entretanto é preciso ter cuidado ao se contemplar algo estático.
Inúmeros Narcisos se afogaram em lagos de imagens e recordaçoes saudosistas. Inúmeros Dorians perderam as almas na busca pela perfeição que se esvai com o tempo.

Segue abaixo um pouco de passado. Outra postagem revisada do meu antigo fotolog. Foi escrita no dia em que embarquei pela primeira vez para Espanha.



“Embarco hoje (22/11/2007) pra Espanha. Devido a um imprevisto financeiro eu não comprei câmera fotográfica. Nada de fotos por enquanto. Providenciarei uma máquina na Europa.

Minha documentação está certa, minhas malas estão arrumadas (levo pouca bagagem, apenas o absolutamente necessário - exceto por uma pesada mala de presentes forrada de sabonetes natura e chocolates brasileiros) e eu já troquei meus reais por euros.

Eu vou, mas fica o lema do saudoso Jeremias: “EU NUNCA ME ARREPENDI!”



"Câmbio"


- Boa tarde, eu gostaria de comprar Euros. Qual é a cotação da moeda hoje?

- O Euro está cotado a 2 reais e 71 centavos para a compra, Senhor.

- Eu gostaria de comprar 1.200 Euros, por favor.
Após uma breve consulta à calculadora a atendente responde:

- São 3.252 reais, Senhor.

Retiro do bolso 3.252 reais e entrego o dinheiro a mulher. No total são 67 notas (65 notas com a figura da onça pintada e 2 notas com a figura do beija-flor).Após certificar-se da quantia a mulher retira da gaveta 12 notas de 100 Euros e as entrega a mim. As notas de 100 Euros são grandes, com tons de verde e azul, e possuem o desenho do Arco do Triunfo.

Enquanto analiso as 12 notas sinto alguém puxando a lateral da minha calça jeans. É um garoto de aparentemente oito anos.
Olho para o garoto, que continua agarrando minha calça, e me espanto ao reconhecê-lo. Ele sou eu com oito anos.

O garoto faz um sinal com a mão para que eu me aproxime. Ele quer cochichar algo no meu ouvido. Quando me agacho para ouvir e ele me acerta um tremendo tapa na cara.

O garoto, sério, me encara com os olhos fixos e com o dedo em riste diz:

- Seu imbecil! Você acabou de trocar 67 notas por 12, e ainda por cima repetidas! Chama a mulher e desfaz essa merda que você fez!

O garoto está irado e eu tento acalma-lo.

- Mas essas 12 notas valem a mesma coisa que as 67 que dei pra ela...

- Por acaso você, ou melhor, eu, vou parar de ter aula de matemática a partir dos 9 anos? Como que 67 pode ser igual a 12? – há um tom de sarcasmo na observação. Sempre gostei de observações sarcásticas.

- É por causa do valor da moeda. O nosso dinheiro é desvalorizado em relação ao Euro em função de aspectos sócio-econômicos complexos. Diga-se de passagem muleque, você vai estudar até os 25 anos e vai se formar em direito. – touché, garotinho insolente!

- Putz... direito? Ah não! Vou escolher outra faculdade. Direito deve ser chato pra porra. Vou é ser piloto de formula 1!

- Não vai não. Você vai desistir de ser piloto quando fizer 12 anos. – Garoto estúpido, acha que é dono da minha vida. Sei tudo o que vai acontecer nos próximos 17 anos da vida dele.

- Por que eu desisto de ser piloto? – o garoto parece intrigado com o futuro.- Isso não vem ao caso. O que quero esclarecer é que, por exemplo, o Dólar vale quase 2 vezes mais do que o nosso dinheiro, o real.

- Quem disse?

- Esse valor é ditado pelo mercado econômico, pela bolsa de valores, etc. É como se as notas fossem figurinhas. As notas como o Dólar e o Euro são mais raras que as notas de reais, e por isso você tem que dar 2 ou 3 notas de reais para cada nota de Dólar ou Euro.

- Tá bom, mas você deu 67 notas de reais e pegou só 12 notas de Euro! Você poderia ter conseguido pelo menos umas100 moedas! Que fossem 30 notas! Na escola, sempre que eu troco figurinha ou bolinha de gude o negócio é pau-a-pau. No máximo 2 por 1, se a figurinha for rara ou se a bolinha de gude for muito diferente. O que aconteceu com você? Ou melhor, o que aconteceu comigo? Trocar 67 por 12 é muita burrice! Tô vendo que eu vô envelhecer e ficar burro...

- Mas é porque depende do valor das moedas. 12 notas de 100 Euros valem mais do que 100 moedas de 1 Euro. E as 67 notas que eu dei pra mulher valem o mesmo que estas 12 notas.

-Pff... até parece. Pega de volta então. Quero ver se ela destroca. – o garoto sinaliza com a cabeça em direção a mulher do guichê, cruza os braços e me encara com um ar de desafio.

Garoto impertinente. Não posso parecer fraco perante mim mesmo. O que vou pensar de mim? Resolvo aceitar o desafio. Me volto para a mulher no guichê e digo que quero desfazer a compra.

- Infelizmente não é possível, Senhor.

- Porque não?

- Nós não “desfazemos” as compras, Senhor.

- Tá... então eu quero vender meus Euros.

- O preço de venda é 2 reais e 57 centavos, Senhor.

Isso totalizaria 3.084 reais. São 168 reais a menos do que eu tinha.
Olho para o garoto de 8 anos ao meu lado. Ele me encara com desprezo e conclui:
- Imbecil.”

terça-feira, 13 de julho de 2010

"Gestalt Onírica"


(Borboletas e Lobos - Grafite)
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Esta borboleta trata-se de outro sonho. No meu sonho acredito que era uma mariposa, mas acabei por desenhar uma borboleta. Ultimamente tenho achado minhas referências gráficas mais interessantes, e até mesmo mais significativas, do que os próprios sonhos.

Henry Walter Bates teria adorado meu desenho. Ele foi um cientista britânico que estudou o mimetismo em borboletas na Amazônia durante o século XIX. Bates constatou que algumas espécies inofensivas se assemelhavam a espécies perigosas ou repugnantes e, desta forma, iludiam seus predadores.

Acredito que “os Hermanns” (Hesse e Rorschach) também teriam gostado do desenho.

O Hermann Hesse escreveu “O Lobo da Estepe” (um romance que narra as transmutações de um cinqüentão intelectualizado que encontra-se preso aos ideais burgueses de sua época, e que vive oscilando entre suas múltiplas possibilidades e a pluralidade do “ser”). Se um homem e até mesmo um lobo são capazes de uma pluralidade de almas, o que se dirá de uma borboleta com suas metamorfoses! Hesse não teria se utilizado da figura do lobo se tivesse pensado em borboletas.

Já Hermann Rorschach desenvolveu o “teste Rorschach”. Trata-se de um teste que utiliza as possíveis interpretações de manchas de tintas simétricas para estabelecer a dinâmica psicológica de um indivíduo. Acredita-se que, ao tentar organizar uma informação ambígua, a pessoa testada projeta aspectos de sua própria personalidade. Muitas das manchas lembram os desenhos encontrados em asas de borboletas.

O que mais chama a sua atenção neste desenho: o lobo ou a borboleta?

Max Wertheimer, Wolfgang Kohler e Kurt Koffka também teriam se interessado pelo desenho. Os três são considerados os idealizadores da Gestalt (uma teoria que possibilitou o estudo da percepção do ponto de vista psicológico). “(...) Segundo a Gestalt o cérebro é um sistema dinâmico no qual se produz uma interação entre os elementos, em determinado momento, através de princípios de organização perceptual (...). Sendo assim o cérebro tem princípios operacionais próprios, com tendências auto-organizacionais dos estímulos recebidos pelos sentidos.(...)”-http://pt.wikipedia.org/wiki/Gestalt
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Pergunto ao desenho: O que queres, borboleta? O que queres, lobo? O que fazes de ponta cabeça em meus sonhos?

“Lobos e Borboletas”

Sonhei que uma grande borboleta entrou na casa de minha familia. Ela sobrevoou a sala e pousou de ponta cabeça, sobre suas antenas, no chão, ao lado do sofá, próxima a mim. Enquanto a borboleta movia lentamente as asas, de uma forma rítmica e quase hipnótica, pude notar que nelas havia o desenho de um lobo.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

"Surrealismo Onírico"

("Bud, Terence e o Cadillac" - Caneta BIC)
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Nem todos os sonhos que tenho possuem um sentido palpável capaz de ser correlacionado com o mundo em que vivemos. O sonho que relato hoje foi marcante nesse sentido. Chamou minha atenção por ser aparentemente absurdo.
O mais espantoso de um sonho sem sentido é que ele pode ter qualquer sentido. É praticamente uma obra surrealista.
Salvador Dalí, profundo conhecedor das teorias de Freud, acreditava que qualquer imagem é capaz multiplicar seu significado até o infinito, dependendo exclusivamente da capacidade delirante do espectador da obra. Ele tratou da sua “teoria da paranóia crítica” em diversos textos, dentre os quais se destaca “La conquista de lo irracional”, publicado em 1935. Neste texto Dalí afirmou que não entendia algumas das imagens que ele mesmo criava não porque as mesmas careciam de significado. Ao contrario, ele defendia que o significado de sua obra era tão profundo, complexo, coerente e involuntário, que fugia da simples análise da intuição lógica.

“Bud, Terence e o Cadillac”

Sonhei que Bud Spencer e Terence Hill participavam de uma campanha publicitária da Rede Carrefour dirigindo um cadillac no estacionamento dos supermercados da empresa.

domingo, 4 de julho de 2010

"Dedo de Deus"

(Neve in the Dark - Grafite)

Este texto foi publicado inicialmente em meu fotolog. Foi escrito há muito tempo. Revisei algumas coisas, mas nada relevante.

Nas palavra abaixo há um pouco de Saulo, Tyler Durden, e Eu.

"Não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação do vosso entendimento." (Romanos 12:2)

“Only after disaster can we be resurrected, it's only after you've lost everything that you're free to do anything. This is your life, and it's ending one minute at a time. You have to realize that someday you will die. Until you know that, you are useless.” (Chuck Palahniuk – Clube da Luta)


“O Dedo de Deus”

Muitas pessoas dizem já terem sido tocadas pelo Dedo de Deus. Ser tocado pelo Dedo de Deus é um momento de revelação da verdade. Trata-se de um momento de contato com o divino; de interação com o sagrado.
Seguia pela rua em direção ao MacDonalds como um dia Saulo seguiu pela estrada em direção a Damasco. O Dedo de Deus surgiu diante de seus olhos e tocou-lhe a fronte.
Ajoelhou-se, como um dia Saulo ajoelhou-se perante a presença divina. Humilde, como Saulo um dia o foi, perguntou: “Quem és Senhor? O que queres de mim?” - Atos 9:5.
A voz celestial indicou-lhe seu dever e ele obedeceu sem hesitar.
Prostrado de joelhos, ciente de seu destino, ergueu os olhos e vislumbrou o escuro orifício de 10,9 mm de diâmetro presente na ponta do Dedo prateado de Deus. O Dedo de Deus, em riste, possui 20,34 cm. O Dedo de Deus é o cano de uma Magnum .44 prestes a escrever, com ferro e pólvora, um evangelho de sangue.
São efetuados seis disparos. O tambor do revolver move-se 60 graus cada vez que o gatilho é acionado até completar uma volta. Após o sexto tiro o ciclo se completa. O ponto de chegada retorna ao ponto de origem. “Do pó vieste, ao pó voltará” - Gênesis.
Entretanto nenhum tiro foi ouvido. Nenhuma explosão de pólvora ecoou. Seguiram-se apenas seis estalos, curtos e secos.
Em seguida houve silêncio e ele respirou. Respirou com a insegurança e a dor daqueles que nunca antes sentiram o ar adentrar os pulmões. Respirou com a solidão e a fragilidade daqueles que dão o seu último suspiro. Sentiu frio e calor ao mesmo tempo. Enquanto expelia lentamente o ar que enchera seus recém descobertos pulmões, compreendeu que iria morrer um dia e lágrimas escorreram de seus olhos. Sua visão turvou-se. Seu pescoço foi incapaz de sustentar o peso de sua cabeça e seus olhos voltaram-se para o chão. Seus demônios desapareceram ao som de passos apressados que seguiam em direção à um beco próximo. Sua carteira havia sido roubada.

Assim como Saulo, mudou. “(...) eis que tudo se fez novo.” – II Cor 5.17.


sábado, 3 de julho de 2010

"Bolhas de Sabão"

(Guerra - Caneta BIC, com as cores invertidas)

Em minhas experiências de locomoção no mundo onírico senti que a vontade é mais relevante do que consciência física. A consciência do "ser" é mais importante do que a consciência do "corpo".
É difícil descrever como me desloco de um ponto a outro enquanto sonho. Às vezes parece que me propago; às vezes sinto como se saltasse entre cenários distintos; às vezes simplesmente deslizo pelo caminho; às vezes vôo.

Voar durante o sonho é compartilhar parte da sabedoria e da beleza das bolhas de sabão. Trata-se de uma experiência existencialista.
Uma bolha de sabão é uma forma perfeita e única que simplesmente voa. Ela não possui asas ou aerodinâmica. Inclusive, me vem à mente um filme chamado “A Fonte da Vida”. Neste grande filme Hugh Jackman interpreta um astronauta que viaja até uma nebulosa onde há uma estrela que está morrendo (chamada pelos Maias de Xibalba, onde teoricamente é o mundo dos espíritos). Sua nave espacial é uma bolha transparente (uma espécie de bolha de sabão). É um filme que fala sobre a morte em todos os aspectos e me pareceu genial utilizar-se da metáfora das estelas e das bolhas de sabão. Estrelas e bolhas de sabão têm muitas coisas em comum. Voar durante um sonho é ser um pouco estrela; é ser um pouco bolha de sabão; é ser livre; é ser vontade; é ser único; é ser efêmero.
Conforme falou Zaratustra:
“E mesmo eu, que estou voltado para a vida, acho que as borboletas, as bolhas de sabão e o que se assemelha a elas entre os homens são o que melhor conhece a felicidade.”
O desenho acima retrata um sonho que tive há algum tempo.

Guerra

Havia uma guerra e eu voei através de campos de batalha. Voei até o templo no alto da montanha. O templo parecia deserto, mas abrigava alguns refugiados assustados e eu temia por eles. Eu conhecia o templo e a montanha. Os soldados me seguiam a pé. Os soldados não me encontrariam. Eu voava em meio a cavernas. Eu voava, conhecia o templo e a montanha. Os soldados jamais me alcançariam. Havia um baú em uma das cavernas.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

"Garoto Perdido"

(Gancho - Caneta BIC, com as cores invertidas)

À minha volta o mundo, em um ritmo frenético, é devorado. Eu vivo e sonho como nunca, minha cara Wendy.

A história de Peter Pan sempre me fascinou. Impossível não se entreter com as aventuras de garotos perdidos que voam, gozam da juventude eterna e combatem piratas em uma terra mágica onde tudo é possivel.
A idéia de Peter Pan influenciou inclusive o mundo da psiquiatria, que utiliza a terminologia “síndrome de Peter Pan” para adultos que se recusam a agir conforme a idade ou que receiam responsabilidades e comprometimentos. Também existem estudos acerca dos arquetipos femininos da obra, representados por Sininho e Wendy.
Toda a história me parece altamente metafórica. Os piratas são adultos ganaciosos, invejosos, vingativos e rancorosos, que vivem em constante luta contra os garotos perdidos, representantes de uma juventude transviada, rebelde, livre e irresponsável. Capitão Gancho e Peter Pan. Adultos e crianças. Pais e filhos.
Os piratas são interessantíssimos, pois querem voar como os garotos perdidos. Trata-se de uma busca pela infância perdida. Trata-se de uma busca pelo sentimento de felicidade capaz de fazer voar. Infelizmente esta capacidade se perdeu em meio a sentimentos egoístas com o passar do tempo. Na história de James M. Barrie o tempo é personificado pelo crocodilo gigante com um relógio em seu interior. O tempo é um perseguidor implacável que incomoda principalmente os mais velhos, devorando-os pouco à pouco ou engolindo-os inteiramente. Também gosto da personificação do tempo na figura do coelho de Lewis Carroll em Alice: sempre a nossa frente, sempre com pressa, sempre correndo e sempre atrasado.

“Carta à Wendy”
Todos estão morrendo.
Sou o único que ainda quer ser jovem para sempre.
O único qua ainda não quer crescer.
Sou o último garoto perdido.
Nunca vou envelhecer.

Segue abaixo um velho conto dentro do contexto, publicado em meu velho fotolog, com pequenas revisões mas ainda com possíveis imperfeições.

“Voar”
Havia um par de asas em meio aos escombros de sua tragédia.
Resolveu colocar-las e sentiu-se leve, muito leve. Tão incrivelmente leve que parecia poder voar. Quando deu-se conta, estava flutuando.
O inesperado poder de voar o fez esquecer-se de suas preocupações. Era a personificação do sentimento de liberdade. Era livre como um pássaro. Simplesmente voava. Sobrevoou ao redor do lustre de seu quarto, deu um rasante sobre a cama e saiu pela janela aberta. Sentiu o vento e logo depois o sol iluminou seu rosto. Iniciou uma subida vertiginosa e tudo foi ficando menor. Suas tragédias começaram a diminuir. A triste casa, cheia de pessoas tristes, foi diminuindo até tornar-se um pequeno telhado em meio a outros pequenos telhados de pequenas casas, que eram separadas por pequenas ruas cheias de pequenos carros e pessoas insignificantes. Logo, tudo era pequeno e insignificante. Continuou seu caminho para o alto. Se conseguisse voar alto o bastante o mundo inteiro tornaria-se apenas um pequeno ponto que desapareceria gradativamente no decorrer da subida.
Entretanto, quanto mais subia mais a temperatura baixava. Já não podia suportar o frio. Começou a sentir tontura devido à escassez de oxigênio e viu-se obrigado a interromper sua trajetória. Parado no ar a uma altura desconhecida, com os braços abertos em meio à imensidão celeste, contemplou o horizonte. Era possível ver a curvatura da terra e o sol refletia um oceano distante. Nenhum pensamento ocupava sua mente. Em meio ao silêncio e a solidão era possível sentir o movimento do universo ao seu redor. Deixou-se levar. Foi durante esse momento de integração com o mundo que criou seu próprio destino. Poderia fazer o que bem entendesse. Era livre e tinha asas para voar. Decidiu viajar.
Apesar de ser aparentemente a decisão mais lógica a ser tomada naquele momento, sua vontade de viajar possuía origem em um instinto primitivo. Vivia o inverno de sua vida e estava motivado pelo mesmo sentimento de migração que faz com que, todos os anos, milhares de pássaros voem em busca de terras desconhecidas. Era como um chamado distante, que emanava de dentro de seu próprio corpo, clamando por algo que lhe faltava.

domingo, 25 de abril de 2010

"Pesca com Baralho"


...........................................(Pesca com Baralho – Caneta BIC)
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Este foi o primeiro sonho que desenhei. Ele foi um sonho marcado pela clareza com que se desenvolveu. O que mais me impressionou foi a forma e a intensidade com que as imagens e sensações seguiram impressas em minha mente após o despertar. Pode-se dizer, paradoxalmente, que eu estava dotado de certa consciência durante o sono.
Tive a oportunidade de experimentar o estado de consciência plena durante o sono algumas vezes. No início a experiência se mostrou tão curiosa quanto assustadora (como no filme "Waking Life"). Com o tempo aprendi a relaxar e, pelo menos por uma vez, fui até mesmo capaz de aproveitar a situação. Mas esta é outra história.
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Pesca com Baralho
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Eu estava só, no alto de uma montanha muito alta. O topo desta montanha era completamente plano, como se houvesse sido cortado horizontalmente. Toda a superfície do terreno era coberta por um gramado verde, muito bem cuidado, que circundava um grande lago de águas escuras e calmas. A paisagem era incrível. Uma ilha em meio a um mar de nuvens que se estendia até o horizonte. Não era possível saber se o sol planejava nascer ou morrer. As luzes e as cores do céu unificavam a alvorada e o crepúsculo em um momento de atemporal permanência. Essas mesmas luzes e cores estão presentes em muitos de meus sonhos. Havia paz e uma leve brisa incapaz de agitar as águas do lago a minha frente. A única protuberância visível ao meu redor era uma pedra. Tratava-se de uma pedra baixa que, aparentemente, brotara do gramado. A pedra estava ao meu lado. Era circular com a parte de cima plana; pequena demais para ser utilizada como mesa; baixa demais para ser utilizada como banco. Em minha mão esquerda havia uma vara de pescar. Em minha mão direita havia um maço de cartas de baralho.
Eu estava feliz e não tinha nenhuma dúvida acerca do que fazer. Peguei uma carta do baralho e coloquei-a cuidadosamente no anzol da vara de pescar. Arremessei a isca inusitada e dei início à pescaria. Após alguns instantes, uma fisgada. Retirei o peixe da água sem grandes dificuldades. Tinha aproximadamente uns trinta centímetros e nada de especial. Retirei-o do anzol e levei-o até a pedra. Havia agora uma faca em minha mão direita. Abri a barriga do peixe e retirei a carta, intacta, de seu interior. Não me lembro com exatidão qual foi a carta retirada do peixe. Algo me diz que foi uma figura da cor vermelha.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

"Inverno"


..........................................................(Canoa - Grafite)
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Fui morar na Espanha em novembro de 2007. Conheci parte de minha família (tios, primos e avós) em Madrid, Barcelona e Granada. Também conheci outras cidades e viajei por diversos países da Europa. Desde então não parei mais de viajar. Sigo sem previsão nem vontade de parar. O próximo destino? Ainda não sei. Levo a vida que quero mas tem dias que acho que "não sou eu quem me navega".
O texto abaixo foi publicado no meu fotolog, alguns dias antes do meu embarque para o velho mundo, e aqui sofreu mudanças pouco significativas (uma pequena revisão).
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05/11/07
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Escolhi ir pra ESPANHA.
Vou pra Espanha. Não sei o que esperar. Mas espero. É difícil lidar com a situação. Vou embora, mas ainda estou aqui. É duro estar aqui e saber que vou embora. É como se eu já não estivesse mais aqui. O problema é que eu também ainda não estou lá. Isso me deixa no meio de lugar algum. É um “momento gerúndio” na minha vida (estou “indo” – estou em algum lugar que não é nem o ponto de partida e nem o ponto de chegada). Não consigo fazer nada construtivo. Tenho cultivado paixões impossíveis e bebedeiras homéricas. Meu problema é que eu gostaria de viver todas as minhas possibilidades. Quero seguir todos os caminhos ao mesmo tempo. Quero ir em todas as direções. O problema é que eu só tenho uma vida. Tenho infinitos sonhos e vivo uma realidade. Todas essas coisas têm dificultado minhas escolhas. Escolher uma coisa é extremamente difícil. Escolher uma possibilidade é não escolher uma infinidade de possibilidades. Escolhi ir pra Espanha.É a vida que eu quero ter.
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Inverno
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Nasceu no dia 15 de julho e foi feliz na infância. Na adolescência teve muitos amigos e namoradas. Apesar da confusa adolescência, estudou. Passou no vestibular e foi para a cidade grande, crescer. Formou-se em direito. Tornou-se advogado. Arrumou um emprego que lhe pagava um bom salário. Comprou um carro. Iniciou um relacionamento estável com uma bela garota, médica. Planejou filhos e netos. Traçou um plano de carreira. Sonhou com o glamour de sua vida promissora. Sabia que era especial e que mudaria o mundo. Pensou que após cumprir seu destino poderia se aposentar na praia. Visualizou a própria morte, que ocorreria durante um sono profundo, em baixo de um edredom, em uma fria noite de inverno. Na segunda feira, dentro do ônibus, desistiu de tudo. Pediu demissão. Terminou o relacionamento. Vendeu tudo o que tinha. Mudou-se para a praia. Nas frias manhãs, surfava. Nas longas tardes, pescava. Durante a noite bebia pinga e jogava dominó. Conheceu uma morena que não tinha dentes. Casou-se e teve três filhos, que andavam nus, com o nariz cheio de areia e ranho. Morava em uma casa modesta, de um quarto, alugada. Surfava cada vez menos. Pescava cada vez menos. Bebia cada vez mais. Saiu novamente bêbado do bar. Contemplou o mar, velho amigo. Fechou os olhos, abriu os braços e deliciou-se com a brisa noturna. Trôpego, entrou em casa. As crianças choravam e sua mulher gritava. Sempre falta alguma coisa. Sentado em sua poltrona, em meio a escuridão, tentou sintonizar algum canal na televisão. Não havia sinal mas isso não era importante. Naquela pequena sala, iluminada apenas pela luz da televisão fora do ar, ouvindo gritos e choros, ele esboçou um tímido sorriso de satisfação, presente apenas no lado direito de sua boca. Era uma fria noite de inverno e ele tinha a vida que quis ter.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

"O Início do Tempo"

.............................................(9:03 - caneta BIC)

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Esse não foi o primeiro sonho que tive, nem o primeiro sonho que desenhei. Entretanto é um sonho que representa o início, conforme explicarei mais adiante. Existem diversos tipos de sonhos e resolvi desenhar os mais intensos que tive. Os desenhos são imaginativos e servem principalmente como uma referência à minha fraca memória. Representar um sonho através de qualquer tipo de arte é extremamente difícil tendo em vista a infinidade de sons, imagens, sensações e sentimentos envolvidos. Do opulento banquete oferecido no mundo onírico não somos capazes de trazer à realidade nada além de míseras migalhas.

O que compartilho com vocês trata-se de uma fração mínima de um espetáculo atemporal no qual fui palco, autor, diretor, todos os artistas e o único membro da platéia. É necessário levar em consideração que o mundo onírico é o mundo das infinitas possibilidades. Nas palavras de Cícero (106-43 A.C.) “Não há nada tão tolo, tão impossível ou tão anti-natural que não possa acontecer num sonho.”

Portanto, partindo do princípio de que o sonho é a máxima expressão da liberdade, busquei manter o máximo de isenção no tocante as possíveis interpretações. Conforme declarou Friedrich Hebbel, dedicado estudante de sonhos, “Nos sonhos a fantasia vinga-se da razão, esse desavergonhado diabrete.”

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9:03

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Sonhei que estava em uma ilha. Fui levado à praia, de onde era possível contemplar o mar. Na linha do horizonte havia diversas pequenas ilhas. Havia silêncio e paz em meio à majestosa paisagem litorânea. O sol estava presente, mas não era visível. Podia ser tanto poente como nascente. O céu apresentava tons que se iniciavam na noite em busca (ou em fuga) do azul celeste, do amarelo, do laranja e do rosa, em meio a uma névoa serena. As estrelas, tão contemplativas quanto eu, pairavam sem vento.

Em meio a este cenário insólito (algo me dizia se tratar da região do Caribe), fui informado que as pequenas ilhas no horizonte representavam momentos específicos no tempo (marcadores naturais) e que o tempo havia se iniciado as 9:03.

terça-feira, 20 de abril de 2010

"O Esquecimento Herdará Minhas Lembranças"

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(Cinzas e Cinzeiros - grafite)
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Resolvi aderir ao Blog. O "fotolog" se mostrou obsoleto diante do "blogger". Evolução? Não. Simplesmente mudança. No novo ambiente virtual revisarei os antigos textos e escreverei novos. Abordarei novos temas. Um pouco das artes em que me aventuro. Um pouco dos sonhos que tenho. Um pouco da realidade que vivo.
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Dorme
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Por que escreves? Por que insistes em escrever?
Não és capaz de suportar a angústia?
Leste e queres ser lido. Entretanto não tens nada a dizer.
Tua solidão não pode ser compartilhada.

Tuas dores cabem somente a ti.
Tuas certezas e incertezas somente a ti fazem sentido.
Por que escreves, se jamais serás compreendido?
Por que escreves, se um dia, como todos os que um dia escreveram, serás esquecido?

Não importa o quão virtuoso és não poderás impedir a sorte.
Não importa qual caminho percorres, todos possuem o mesmo destino: a morte.
Por que escreves?
Dorme, e tenta lembrar dos sonhos ao acordar.